RELATÓRIO Nº 189/20 CASO 12.569 RELATÓRIO DE MÉRITO COMUNIDADES QUILOMBOLAS DE ALCÂNTARA BRASIL1 14 de junho de 2020 I. INTRODUÇÃO 1. Em 17 de agosto de 2001, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (doravante “a Comissão Interamericana”, “a Comissão” ou “a CIDH”) recebeu uma petição apresentada por representantes das comunidades quilombolas de Samucangaua, Iririzal, Ladeira, Só Assim, Santa Maria, Canelatiua, Itapera e Mamuninha, situadas em Alcântara; pela Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH); pelo Centro de Cultura Negra do Maranhão (CCN); pela Associação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas do Maranhão (ACONERUQ); pela Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Estado do Maranhão (FETAEMA); pelo Centro de Justiça Global; e pela Global Exchange (doravante “a parte peticionária”). Na petição, foi alegada a responsabilidade internacional da República Federativa do Brasil (doravante “Estado brasileiro” ou “o Estado”) por afetar a propriedade coletiva de 152 comunidades quilombolas de Alcântara, devido à falta da emissão de títulos de propriedade, à instalação de uma base aeroespacial sem respeitar os direitos à consulta e consentimento prévios, à desapropriação das suas terras e territórios e à falta de recursos judiciais para remediar tal situação. 2. A Comissão aprovou o Relatório de Admissibilidade Nº 82/06 em 21 de outubro de 2006 e o transmitiu às partes em 6 de novembro de 20062. As partes contaram com os prazos regulamentares para formular observações adicionais sobre o mérito. Todas as informações recebidas foram devidamente transmitidas às partes. A CIDH realizou uma audiência pública relativa ao caso em 12 de novembro de 2019 no âmbito do seu 174º Período de Sessões3. II. ALEGAÇÕES DAS PARTES A. Parte peticionária 3. A parte peticionária alega a responsabilidade do Estado por afetar a propriedade coletiva de 152 comunidades quilombolas de Alcântara. Explica que quilombolas são comunidades tradicionais que têm sua própria cultura, formas de comunicação e regras internas. Acrescenta que, devido à sua importância histórica e cultural, a Constituição brasileira de 1988 reconheceu o direito dessas comunidades aos seus territórios. Sustenta que, apesar disso, o Estado não concedeu títulos definitivos de propriedade às comunidades. 4. A parte peticionária afirma que, em 1983, foi criado o Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) em parte do território reivindicado pelas comunidades. Assinala que os objetivos iniciais do CLA eram apoiar as atividades de lançamento e acompanhamento de veículos aeroespaciais, assim como realizar testes e Conforme disposto no artigo 17.2 do Regulamento da Comissão, a Comissária Flávia Piovesan, de nacionalidade brasileira, não participou do debate nem da decisão do presente caso. 2 CIDH. Relatório Nº 82/06. Petição 555-01. Admissibilidade. Comunidades de Alcântara. Brasil. 21 de outubro de 2006. A CIDH declarou admissível os “fatos denunciados e os artigos 16, 17, 21, 24, 8 e 25, conjuntamente com os artigos 1.1 e 2 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, tanto como os artigos VI, VIII, XII, XIII, XIV, XVIII, XXII e XXIII da Declaração Americana, para os fatos ocorridos com anterioridade a 25 de setembro de 1992”. 3 CIDH. Audiência Pública. 174º Período de Sessões. 12 de novembro de 2019. A Comissão recebeu, durante essa audiência, as declarações da testemunha Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira, funcionária do Ministério Público Federal, e do perito antropólogo Alfredo Wagner Berno de Almeida, apresentadas pelos representantes; assim como de Sérgio Antônio Frazão Araújo, ex-funcionário do CLA, e André Luis Barreto Pues, do programa espacial brasileiro, na qualidade de testemunhas apresentadas pelo Estado. Com relação à impugnação apresentada pelo Estado quanto à testemunha Deborah Macedo Duprat, a Comissão nota que sua qualidade de funcionária pública não afeta sua idoneidade como testemunha. Sua declaração é relativa aos fatos que presenciou ou dos quais teve conhecimento. O vínculo que a testemunha possa ter com os fatos do caso ou com as partes do processo não afeta sua idoneidade. 1

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