I.
RELATÓRIO No. 5/20
CASO 12.571
RELATÓRIO DE MÉRITO
NEUSA DOS SANTOS NASCIMENTO E GISELE ANA FERREIRA
3 março 2020
INTRODUÇÃO 1
1. Em 8 de dezembro de 2003, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (doravante “Comissão”,
“Comissão Interamericana” ou “CIDH”) recebeu uma petição apresentada pelo Instituto da Mulher Negra Geledés (doravante “parte peticionária”) na qual se alega a responsabilidade internacional da República
Federativa do Brasil (doravante “Estado brasileiro”, “Brasil” ou “Estado”) pela suposta discriminação racial
sofrida no mercado de trabalho por Neusa dos Santos Nascimento e Gisele Ana Ferreira em 1998, bem como pela
impunidade que se seguiu ao fato.
2. A Comissão aprovou o Relatório de Admissibilidade No. 84/06 em 21 de outubro de 2006 2 . Em 6 de
novembro de 2006, a Comissão notificou esse relatório às partes e se colocou à disposição para uma solução
amistosa. As partes contaram com todos os prazos regulamentares para apresentar suas observações adicionais
sobre o mérito. Todas as informações recebidas foram devidamente trasladadas entre as partes.
II. ALEGAÇÕES DAS PARTES
A. Parte peticionária
3. A parte peticionária alega que Neusa dos Santos Nascimento e Gisele Ana Ferreira, ambas negras, foram
vítimas de racismo por Munehiro Tahara, empregado da empresa privada Nipomed Planos de Saúde em 1998.
De acordo com o relatado pela parte peticionária, isso teria ocorrido porque Neusa e Gisele, ambas de cor negra,
foram prontamente excluídas da seleção de emprego ao serem vistas pelo entrevistador Munehiro Tahara, que,
sem sequer solicitar seus dados profissionais, lhes teria dito que a vaga já estava preenchida. Acrescenta a parte
peticionária que no mesmo dia, no turno seguinte, uma candidata branca apresentou-se para a seleção e foi
recebida por Munehiro Tahara, tendo sido contratada para a vaga.
4. Afirma a parte peticionária que os fatos não foram tratados de forma adequada pelo Estado brasileiro. Em
relação ao caso concreto, diante de uma denúncia apresentada pelas vítimas contra o senhor Tahara, sustenta,
em primeiro lugar, que a sentença absolutória de primeira instância foi injusta ao fundamentar a decisão na
ausência de provas. Além disso, afirma que na segunda instância o recurso de apelação levou cerca de três anos
para ser distribuído a um Desembargador. Também ressalta que a decisão de segunda instância condenatória
dosou a pena em tempo muito baixo e decretou erroneamente a prescrição da pretensão executória, erro esse
que ensejou novo recurso que resultou na reforma da condenação nesse ponto. Sustenta, ainda, que o regime de
cumprimento da pena, incialmente fixado em semiaberto, foi alterado para aberto por força de decisão posterior
em Habeas Corpus, o que corrobora os estudos que demonstram que o crime de racismo recebe sempre, ao final,
solução menos gravosa ao autor do fato do que o prejuízo sofrido pelas vítimas. Além disso, defende que a
demora na tramitação do caso gera ainda mais constrangimento para as vítimas, aumentando seus danos morais
e materiais. Por fim, a demora estatal em responder aos fatos configura verdadeira negativa de acesso à justiça.
5. Com respeito à indenização civil, aduz que o sistema de reparação interno é ineficaz. A parte peticionária
noticia que a ação civil proposta por uma das vítimas teve decisão definitiva sem julgamento de mérito por terse entendido que a autora se omitiu em promover ato processual que lhe competia.
Conforme disposto no artigo 17.2 do Regulamento da Comissão, a Comissária Flávia Piovesan, de nacionalidade brasileira, não participou
do debate nem da decisão do presente caso.
2 CIDH. Relatório de admissibilidade No. 84/06. Caso 12.571. Neusa dos Santos Nascimento e Gisele Ana Ferreira. Brasil. 21 de outubro de
2006. A Comissão admitiu a alegação de suposta violação dos artigos 1, 8, 24 e 25 da Convenção Americana.
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