6. Com relação ao tratamento geral conferido pelo Brasil às questões raciais, a parte peticionária diz que o caso
concreto espelha o padrão histórico do país em diminuir o problema, e que os avanços existentes na verdade
não decorrem da vontade estatal, mas sim da grande pressão da população afrodescendente organizada. Que,
apesar de a Constituição trazer princípios norteadores para uma sociedade justa, a lei 7716/89, que define os
Crimes Resultantes de Preconceitos de Raça ou de Cor, é ineficaz, porquanto os responsáveis pela aplicação da
lei constantemente desqualificam o crime de racismo para o de injúria qualificada, sujeitando fatos racistas a
disposições legais menos gravosas e aos prazos prescricionais. Que as frequentes demoras injustificadas
ocorridas nos processos judiciais fazem com que muitas vezes as vítimas desistam de levar adiante seus casos
ou venham a falecer antes de ver seus casos solucionados. Que estudos realizados por órgãos oficiais
demonstram que pessoas de cor negra recebem tratamento judicial inferior, ferindo o princípio da igualdade,
pois a elas a justiça ou é negada, ou é aplicada de forma mais gravosa, como no caso de réus negros que recebem
pena criminal máxima.
B. Estado
7. O Estado reitera suas alegações sobre a inadmissibilidade do caso. O Estado argumenta que o caso não
deveria ter sido admitido, em especial porque o sistema de petições individuais não se presta a servir como
instância de revisão do mérito das conclusões alcançadas pelas autoridades públicas nacionais no adequado
exercício de suas competências, sob pena de a CIDH extrapolar a sua competência ratione materiae e o seu
caráter complementar e subsidiário. Também afirma que o peticionário não atendeu o requisito de
admissibilidade do esgotamento dos recursos internos porque o processo criminal ainda estava aberto quando
a petição foi apresentada 3.
8. O Estado alega que o processo criminal seguido foi um remédio adequado e eficaz. Informa que a Quinta
Câmara Criminal Extraordinária do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo condenou o acusado à pena de
dois anos de reclusão, em regime inicial semiaberto pelo crime imputado, sendo que o regime foi posteriormente
alterado para regime aberto em razão de decisão de Tribunal Superior em recurso de Habeas Corpus, seguindo
todos os dispositivos legais pertinentes. Que o regime aberto está em consonância com o XII Congresso
Internacional Penal e Penitenciário de Haia de 1950 e com o I Congresso da ONU sobre Prevenção do Crime e
Tratamento do Delinquente de Genebra de 1955. Que o contato do apenado com a sociedade é medida
humanitária, educativa e social que afasta o isolamento carcerário e contribui com a ressocialização e
reintegração da pessoa.
9. Sobre o tempo transcorrido, alega que não houve demora injustificada por parte do Judiciário brasileiro e
que a parte peticionária não provou esta situação. Que o período de tramitação do processo foi influenciado pelo
comportamento das partes, que se utilizaram regularmente dos recursos legais previstos no ordenamento. Que
a demora na distribuição do processo no Tribunal de Justiça deveu-se ao abarrotamento de casos próprio do
Poder Judiciário brasileiro, não tendo relação com as partes, e não prejudicou o resultado do processo. Sobre os
atos em si, prega que o artigo 24 da CADH, interpretado na Opinião Consultiva 4/84 da Corte IDH, veda que os
Estados adotem leis discriminatórias, não se referindo a condutas individuais, quer de particulares, quer de
agentes do Estado, e que o peticionário não alega nenhuma conduta estatal nem qualquer violação de direitos
humanos das supostas vítimas no que se refere à igualdade perante a lei. Ao contrário, que o presente
procedimento aborda justamente violação por um indivíduo da lei 7716/89, sendo que a resposta estatal à
conduta individual foi de condenação criminal definitiva. Ademais, que o Brasil tem, em sua Constituição Federal,
dispositivo que determina serem os crimes de racismo imprescritíveis, inafiançáveis e puníveis com reclusão.
Com relação à ineficácia da lei 7716/89, aponta o Estado que os peticionários se limitaram a fazer afirmação
genérica desacompanhada de dados estatísticos que não guarda relação com o presente caso, posto que em
nenhum momento questionou-se a classificação dos fatos imputados.
A Comissão toma nota de que, na etapa de mérito, o Estado do Brasil alegou que não havia recebido a comunicação da parte peticionária
de 6 de setembro de 2006. Afirmou que isso gerou um prejuízo no equilíbrio processual das partes e que, inclusive, a informação contida
nessa comunicação: i) foi incorporada pela CIDH em seu Relatório de Admissibilidade No. 84/16 de 21 de outubro do mesmo ano; e ii)
continha informação incorreta, em particular a de que se “desconhecia o paradeiro do Sr. Munehiro Tahara”. A esse respeito, a Comissão
esclarece que a comunicação mencionada pelo Estado de 6 de setembro de 2006, sobre a qual se fez referência em seu Relatório de
Admissibilidade, foi enviada ao Brasil em 11 de outubro de 2006.
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