VOTO CONCORDANTE DO JUIZ A. A. CANÇADO TRINDADE
1.
Voto a favor da adoção da presente Sentença pela Corte Interamericana de
Direitos Humanos, de transcendência histórica, sobre o mérito no caso Barrios Altos, a
partir do reconhecimento de responsabilidade internacional efetuado pelo Estado
peruano. Tal como observou a Corte (par. 40), esse reconhecimento constituiu uma
contribuição positiva por parte do Estado demandado à evolução da aplicação da
normativa de proteção da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. As
alegações, tanto do Estado peruano como da Comissão Interamericana de Direitos
Humanos, desenvolvidas na memorável audiência pública realizada no dia de hoje, 14
de março de 2001, na sede do Tribunal, abriram uma nova perspectiva na experiência
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da Corte em casos de acatamento por parte do demandado.
2.
Em razão da alta relevância das questões jurídicas tratadas na presente
Sentença, vejo-me na obrigação de deixar registradas, sob a pressão sempre
implacável do tempo, minhas reflexões pessoais a esse respeito. A Corte, em
quaisquer circunstâncias, e inclusive em casos de acatamento, através do
reconhecimento de responsabilidade internacional por parte do Estado demandado em
relação aos fatos violatórios dos direitos protegidos, tem plena faculdade para
determinar, motu próprio, as consequências jurídicas daqueles fatos lesivos, sem que
esta determinação esteja condicionada pelos termos da aceitação. Procedendo desse
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modo, a Corte está fazendo uso dos poderes inerentes à sua função judicial. Tal como
sempre tenho sustentado no seio do Tribunal, em quaisquer circunstâncias a Corte é
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mestre de sua jurisdição.
3.
No presente caso Barrios Altos, fazendo uso livre e pleno, como lhe
corresponde, dos poderes inerentes à sua função judicial, a Corte, pela primeira vez
em um caso de acatamento, além de ter admitido o reconhecimento de
responsabilidade internacional por parte do Estado demandado, também estabeleceu
as consequências jurídicas de tal aceitação, tal como se desprende dos categóricos
parágrafos 41 e 43 da presente Sentença, que dispõem de modo inequívoco o
entendimento da Corte no sentido de que
- "(...) São inadmissíveis as disposições de anistia, as disposições de prescrição e
o estabelecimento de excludentes de responsabilidade que pretendam impedir a
investigação e punição dos responsáveis por graves violações dos direitos
humanos tais como tortura, execuções sumárias, extralegais ou arbitrárias e
desaparecimentos forçados, todas elas proibidas por violar direitos inderrogáveis
reconhecidos pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos.
1
Artigo 52(2) do Regulamento vigente da Corte Interamericana de Direitos Humanos.
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Cf., anteriormente, os casos Aloeboetoe (1991), Série C Nº 11; El Amparo (1995), Série C Nº 19;
Garrido e Baigorria (1996), Série C Nº26; Benavides Cevallos (1998), Série C Nº 38; Caracazo (1999), Série
C Nº 58; e Trujillo Oroza (2000), Série C Nº 64.
3
Cf., nesse sentido, meu Voto Dissidente no caso Genie Lacayo (Revisão de Sentença, Resolução de
13.09.1997), Série C Nº 45, par. 7.
4
Cf., v.g., meu Voto Concordante na Parecer Consultivo Nº 15, sobre os Relatórios da Comissão
Interamericana de Direitos Humanos (1997), Série A Nº 15, pars. 5-7, 9 e 37; meu Voto Concordante na
Resolução sobre Medidas Provisórias de Proteção no caso James e Outros, de 11.05.1999, pars. 6-8, in Corte
Interamericana de Direitos Humanos, Compêndio de Medidas Provisórias (Julho 1996/Junho 2000), Série E
Nº 2, pp. 341-342.